Privilegiados: o valor da experiência em tempos de mudança
- Marco Piquini
- há 19 horas
- 2 min de leitura

Completei 68 anos. Faço parte da geração “baby boomer”, que inclui os nascidos entre 1946 e 1964. Nasci em 1957, bem no meio do período. Não me sinto velho, mas privilegiado.
Nós, dessa época, ainda vivos, olhamos para trás e percebemos que (sobre)vivemos a um dos mais movimentados e transformadores períodos da história do mundo. Experimentamos, na verdade, vários mundos, uma “metamorfose ambulante”.
Eu e meus colegas geracionais brincamos na rua. Vencemos inimagináveis perigos e resistimos ao inclemente mertiolate. Fomos criados dentro do conceito da comunidade física, antes da virtual. Aprendemos a valorizar o contato pessoal, a argumentar verbalmente, no calor do momento. Talvez, por conta disso, sabemos defender nossas ideias de forma mais articulada. Vocabulário e destreza verbal costuma ser uma (boa) característica nossa.
Nosso mundo começou bem antes da internet e da IA. Escrevemos de forma cursiva. Passamos pela máquina de escrever, pelos processadores de texto e, por fim, pelos computadores. Talvez a gente não tenha a desteridade de quem já nasceu com um computador na mão, mas sabemos que uma coisa é usar a ferramenta, outra é entender que ela é apenas uma ferramenta.
Artisticamente, assistimos ao nascimento dos Beatles. Lembro-me, aos sete, oito anos, cantando a música “Help” para o meu pai enquanto ele fazia a barba no banheiro de casa. Depois deles, veio o rock’n’roll e tudo o mais que se seguiu, traduzindo e popularizando o conceito da “juventude”, quebrando moldes e estabelecendo novos padrões de rebeldia ao mundo.
Nossa geração viu a guerra do Vietnã, que desmascarou a sordidez de todas as guerras. Fizemos o “V” do “paz e amor”. Participamos ativamente da redemocratização brasileira, levando porrada nas ruas. Contribuímos com a ascensão das liberdades individuais, abrindo caminho para todas as outras liberdades que hoje conquistam seus espaços. E já ouvimos todos os discursos, por isso sabemos “ler” o que realmente importa. E tanta coisa mais.
Tanta coisa. E agora, sentindo no corpo o peso dos anos, percebemos, como seres humanos ainda pensantes e produtivos, que ao invés de enfrentarmos a curva descendente da decadência, na verdade nos defrontamos com um mundo de novas oportunidades, baseadas exatamente em... nossa experiência. Todo um universo se abre para nossos potenciais acumulados por todas a essas vidas que vivemos.
Em um mundo que se esfarela na fricção entre o “fantasma da máquina” e a barbárie dos homens, temos um espaço a ocupar. Seguimos em frente, ainda fazendo parte da construção do mundo à nossa volta. Não sozinhos, mas em parceria com outras gerações, de quem absorvemos “como esponjas” lições de vida muito diferentes das nossas, e exatamente por isso muito enriquecedoras. Porque aprendemos com erros e acertos. Entendemos melhor a relatividade do tempo. Agregamos perspectivas mais amplas. Somos resilientes.







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